Qual o significado da investigação comercial conduzida por Trump
O empresário acionou a Seção 301 do Código Comercial Americano. O procedimento incomum agrava ainda mais o relacionamento entre os países.

O governo de Donald Trump optou por investigar práticas comerciais do Brasil, classificando-as como “desleais”. A Casa Branca promoveu, assim, a tensão com o setor produtivo brasileiro (e com o governo Lula), reconfigurando o cenário comercial por motivos políticos.
CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
O republicano também utilizou o seu apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) como justificativa para as medidas, que foram vistas como insuficientes por especialistas.
A investigação será conduzida sob a Seção 301 da Lei Comercial dos Estados Unidos, um instrumento controverso que possibilita ao governo norte-americano investigar e punir unilateralmente práticas consideradas prejudiciais ao comércio do país.
Leia também:

Jovens representam o principal público-alvo do programa Minha Casa, Minha Vida

Compreenda as alterações no novo licenciamento ambiental

Mega-Sena 2889: sorteio de quinta-feira (17) pode entregar prêmio de R$ 3,5 milhões
A Seção 301, ferramenta incomum de retaliação comercial, autoriza Washington a aplicar tarifas e outras medidas restritivas sem a necessidade de aprovação multilateral. É um instrumento que coloca os EUA na posição de juízes, permitindo que o país defina o que considera incoerente no comércio internacional.
A Administração de Operações Comerciais dos Estados Unidos (USTR) inicia uma investigação, que poderá se estender por até 18 meses. Durante esse período, o governo americano examina as práticas do país sob análise e pode buscar alterações por meio de negociações. Em caso de falta de acordo, Washington pode aplicar sanções unilaterais.
CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
James Green, professor titular emérito da Brown University e presidente do Washington Brazil Office (WBO), declarou à CartaCapital que a investigação comercial representa um avanço mais relevante do que o mero aumento das tarifas de importação.
Isso implica em um processo burocrático de investigação, sendo mais difícil remover o Brasil desse procedimento, uma vez que ele já teria sido iniciado. Trata-se de um processo que pode levar vários meses, podendo determinar que as tarifas ao Brasil são realmente justificáveis, o que seria um desastre.
Do multilateralismo à guerra comercial
Até o primeiro governo Trump, os Estados Unidos utilizavam a Seção 301 principalmente como instrumento de pressão para construir casos na Organização Mundial do Comércio. Mesmo com a ameaça global que o republicano começava a representar, o sustentáculo do multilateralismo ainda não havia sido colocado tão em xeque quanto neste momento.
A ascensão de Trump ao poder em 2017 levou os EUA a iniciar seis investigações, um número elevado para um mandato de quatro anos. A China foi o principal foco, sendo investigada em duas ocasiões, seguida pela União Europeia.
As investigações chinesas geraram tarifas que atingiram 25% sobre centenas de bilhões de dólares em produtos. Isso marcou o início da guerra comercial sino-americana, que remodelou o comércio global e obrigou países como o Brasil a se posicionarem.
Com a redefinição de que os instrumentos comerciais devem ser empregados como instrumento político, o Brasil se torna alvo.
O comunicado da USTR aponta seis áreas de investigação, questionando desde políticas digitais até práticas ambientais, incluindo tarifas preferenciais e proteção da propriedade intelectual.
O documento aponta que o Brasil discrimina empresas norte-americanas de pagamento eletrônico – em razão da massiva adoção do Pix –, oferece tarifas inferiores a outros parceiros comerciais e não implementa medidas eficazes de combate à corrupção. Há também críticas em relação à proteção de direitos autorais e patentes, um ponto delicado para grandes empresas tecnológicas americanas.
Para Green, as acusações carecem de fundamento. No âmbito ambiental, por exemplo, abundam os exemplos de que nos últimos anos os índices de desmatamento diminuíram no país, mesmo com os desafios contínuos. O tema, ademais, é praticamente desconsiderado pela administração atual na Casa Branca.
É difícil atribuir racionalidade a uma pessoa que, praticamente o tempo todo, age de maneira irracional, afirma o pesquisador. É uma irracionalidade contra o Brasil, que tem a ver com a pressão da extrema-direita, através de Steve Bannon.
A investigação pode gerar maiores obstáculos no acesso do setor privado brasileiro ao mercado americano, com empresas sujeitas a novas barreiras burocráticas e dúvidas acerca de suas operações.
O governo Lula (PT) ainda não possui total clareza sobre como lidar com o problema do campo minado criado por Trump. A Presidência da República acredita que a solução passa obrigatoriamente pela diplomacia, mas já estabelece as condições para uma possível retaliação.
Na quarta-feira, 16, o ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), manifestou-se como “inacreditável” a preocupação de Trump com o uso do Pix no Brasil e com a atividade comercial da Rua 25 de Março, em São Paulo, que o Palácio da Alvorada acusa genericamente de ser um dos grandes mercados de produtos falsificados.
Fonte por: Carta Capital
Autor(a):
Gabriel Furtado
Gabriel é economista e jornalista, trazendo análises claras sobre mercados financeiros, empreendedorismo e políticas econômicas. Sua habilidade de prever tendências e explicar dados complexos o torna referência para quem busca entender o mundo dos negócios.