Os próximos passos de Lula em face da crescente inflação
Avaliar o Planalto, ainda, seria preferível a ceder a uma interferência explícita na Justiça brasileira.

O presidente Lula já se prepara para que, a partir de 1º de agosto, as exportações brasileiras sejam sobretaxadas em 50% pelos Estados Unidos. No Palácio do Planalto, a convicção é de que não há concessão política capaz de fazer Donald Trump recuar — muito menos a que o republicano exige nos bastidores: enterrar a ação penal contra Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal, algo fora da alçada constitucional de Lula. “O custo político de atendê-lo seria maior do que o custo econômico da tarifação”, resume um auxiliar do petista.
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A carta de 9 de julho, em que o republicano anunciou a tarifa, vinculava o tema comercial diretamente à defesa de Bolsonaro: logo na primeira linha, Trump denunciava o processo no STF como uma “caça às bruxas” que deveria acabar imediatamente. Negociar, resume este mesmo auxiliar, se aproxima do impossível. O vice-presidente Geraldo Alckmin tentou dialogar em março, quando a Casa Branca cogitava um imposto de 10%, e retomou a iniciativa após a alíquota subir para 50%. Não obteve resposta.
A percepção em Brasília é de que Trump centralizou as decisões, afastou a própria equipe técnica e mantém vaga a embaixada em Brasília. O objetivo final seria levar o ex-capitão ao novo poder em 2026, para que ele afaste o Brasil da China e dos Brics.
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Diante da crise diplomática, uma alternativa viável é a via judicial: em 18 de julho, a importadora Johanna Foods entrou com um processo na Corte de Comércio Internacional dos EUA, alegando a perda de 68 milhões de dólares anualmente e que o consumidor pagará 25% a mais pelo suco de laranja brasileiro. Caso esta ação não seja bem-sucedida, o Planalto promete acionar a Lei da Reciprocidade Econômica, aprovada em abril por iniciativa do senador Zequinha Marinho (PSC-PA). A retaliação seria seletiva: medicamentos poderiam ter patentes suspensas, facilitando o acesso pelo SUS, e produtos audiovisuais americanos passariam a incorrer em sobretaxas.
Lula tem procurado apoio externo. Em 21 de julho, recebeu solidariedade de líderes de Chile, Colômbia, Espanha e Uruguai durante encontro em Santiago. Dois dias depois, em Genebra, o Brasil fez uma forte denúncia à política tarifária dos Estados Unidos na Organização Mundial do Comércio; cerca de quarenta países, inclusive toda a União Europeia, aderiram ao protesto, e o bloco europeu estuda mecanismos para pressionar Washington no próprio organismo.
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Nos Estados Unidos também há vozes críticas à escalada protecionista. O Nobel de Economia Paul Krugman publicou um artigo elogiando o Pix após que o sistema de pagamentos brasileiro entrou no radar de investigações comerciais abertas por Trump em 15 de julho. A popularidade do sistema brasileiro ameaça os negócios de empresas americanas que cobram pela utilização de cartão de crédito.
Em relação à declaração de Trump sobre o Brasil por suposta falta de “eleições livres”, o cientista político Stephen Levitsky, em entrevista à BBC Brasil, declarou que “o Brasil é hoje mais democrático que os Estados Unidos”, relembrando a resposta contundente de Brasília à tentativa de golpe de 2022, em contraste com a reação americana à invasão do Capitólio. Levitsky é co-autor de A tirania da minoria, de 2024, em que teoriza que os EUA não são um modelo de democracia. É mais conhecido, no entanto, por Como as democracias morrem, publicado em 2018, no primeiro governo Trump.
Fonte por: Carta Capital
Autor(a):
Júlia Mendes
Apaixonada por cinema, música e literatura, Júlia Mendes é formada em Jornalismo pela Universidade Federal de São Paulo. Com uma década de experiência, ela já entrevistou artistas de renome e cobriu grandes festivais internacionais. Quando não está escrevendo, Júlia é vista em mostras de cinema ou explorando novas bandas independentes.