O desmatamento diminui as chuvas em 74% e eleva a temperatura em 16% na Amazônia

Estudo conduzido por pesquisadores da USP quantifica, pela primeira vez, os efeitos da destruição da floresta e das alterações climáticas globais no bioma.

03/09/2025 12:11

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O desmatamento diminui as chuvas em 74% e eleva a temperatura em 16% na Amazônia
(Imagem de reprodução da internet).

O desmatamento na Amazônia brasileira contribui para aproximadamente 74,5% da diminuição das chuvas e para 16,5% do aumento da temperatura do bioma durante os períodos de seca, conforme um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP).

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O estudo apresenta resultados cruciais para direcionar estratégias eficientes de mitigação e adaptação, assuntos centrais da Conferência do Clima das Nações Unidas, a COP30, que ocorrerá em novembro em Belém (PA).

Cientistas avaliaram dados ambientais, de variações atmosféricas e de uso do solo de aproximadamente 2,6 milhões de quilômetros quadrados (km2) – 29 blocos com área de cerca de 300 km por 300 km cada um – na Amazônia Legal brasileira durante um período de 35 anos (1985 a 2020).

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Através de modelos estatísticos paramétricos, analisaram os impactos da devastação florestal e das mudanças na temperatura, na precipitação e nas taxas de emissão de gases de efeito estufa.

As chuvas registraram uma redução de aproximadamente 21 milímetros (mm) na estação seca anualmente, com o desmatamento contribuindo para uma diminuição de 15,8 mm. Já a temperatura máxima aumentou cerca de 2 °C, sendo 16,5% atribuídos ao efeito da perda florestal e o restante às mudanças climáticas globais.

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Diversos estudos científicos sobre a Amazônia já demonstram que a temperatura está mais elevada, que a chuva tem diminuído e que a estação seca aumentou, porém ainda não havia a separação do impacto das mudanças climáticas, causadas principalmente pela poluição de países do hemisfério Norte, e do desmatamento provocado pelo próprio Brasil.

O professor Luiz Augusto Toledo Machado, por meio desse estudo, conseguiu separar e dar peso a cada um desses componentes, demonstrando, de certa forma, uma espécie de “conta a pagar”.

O pesquisador do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP) e colaborador do Departamento de Química do Instituto Max Planck, na Alemanha, Machado afirma à Agência FAPESP que os resultados reforçam a importância da conservação da floresta em pé para manter a resiliência climática.

A pesquisa evidenciou que o impacto do desmatamento é mais significativo nos estágios iniciais. As maiores alterações no clima local se manifestam já nos primeiros 10% a 40% da perda da cobertura florestal.

As alterações, sobretudo na temperatura e na precipitação, são mais significativas nas primeiras porcentagens de desmatamento. Destarte, é necessário preservar a floresta, o que se torna evidente. Não se pode transformá-la em outras coisas, como áreas de pastagem. Se houver alguma forma de exploração, esta precisa ser sustentável, complementa o professor Marco Aurélio Franco, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP.

Equilíbrio delicado do ecossistema.

A Amazônia, sendo a maior e mais diversa floresta tropical do mundo, desempenha um papel crucial na regulação do clima global. Ela é responsável, por exemplo, pelos conhecidos “rios voadores” – correntes de água invisíveis que circulam pela atmosfera e abastecem outros biomas, como o Cerrado. As árvores absorvem água do solo através das raízes, transportam até as folhas e a liberam para a atmosfera em forma de vapor.

Em 2023, um grupo de pesquisadores internacional, com a participação de Machado e do professor Paulo Artaxo, do IF-USP, publicou um estudo na Nature que demonstrou, pela primeira vez, o mecanismo físico-químico responsável pela formação das chuvas no bioma.

Implica a geração de nanopartículas de aerossóis, descargas elétricas e reações químicas em grandes altitudes, entre a noite e o dia, formando um tipo de “máquina” de aerossóis que produz nuvens.

Contudo, o desmatamento e os processos de degradação da floresta contribuem para a alteração desse ciclo de chuvas, intensificando a estação seca em escala local e elevando os períodos de incêndios florestais.

Entre 1985 e 2023, a Amazônia brasileira registrou uma redução de 14% em sua cobertura vegetal nativa, alcançando uma área de 553 mil km2, similar ao tamanho da França. A expansão de pastagens foi o fator predominante nesse período.

Apesar de ter atingido o segundo menor índice de desmatamento entre agosto de 2024 e julho de 2025 – uma área de 4.495 km² –, o desafio permanece em controlar a degradação, principalmente aquela causada pelo fogo.

A região semiárida – entre junho e novembro – é o período em que os impactos do desmatamento são mais evidentes, sobretudo em relação à precipitação. Os efeitos acumulados intensificam ainda mais a sazonalidade.

Analisar os dados

Os pesquisadores utilizaram equações paramétricas de superfície, levando em conta as variações anuais e o desmatamento. Isso possibilitou distinguir as contribuições específicas das mudanças climáticas globais e da perda de vegetação.

Utilizaram-se ainda bancos de dados de sensoriamento remoto e reanálises de longo prazo, abrangendo as classificações de uso da terra elaboradas pelo MapBiomas.

Ademais, os resultados referentes à chuva e à temperatura foram complementados por uma análise de gases de efeito estufa. Observou-se que, durante o período de 35 anos, o crescimento nas taxas de dióxido de carbono (CO2) e de metano (CH4) foi quase totalmente causado pelas emissões globais (mais de 99%).

Detectou-se um aumento de aproximadamente 87 partes por milhão (ppm) para o CO e cerca de 167 partes por bilhão (ppb) para o CH4.

Foram analisados dados ambientais, de variações atmosféricas e de uso do solo de cerca de 2,6 milhões de km² na Amazônia Legal brasileira durante um período de 35 anos (1985 a 2020) (gráfico: Marco Aurélio Franco et al./Nature Comm., versão).

Inicialmente, esse resultado aparentava ser contraditório com outros estudos que evidenciam o impacto do desmatamento na diminuição da capacidade da floresta de absorver CO2 da atmosfera. Contudo, não se trata de um caso isolado, considerando a magnitude do fenômeno.

Machado explica que, em relação à concentração, o aumento é predominantemente devido às emissões globais.

Os pesquisadores no artigo alertam que, caso o desmatamento persista sem controle, os resultados indicam um declínio ainda maior na precipitação total durante a estação seca e um aumento adicional da temperatura.

O desmatamento na Amazônia já está modificando os padrões da monção sul-americana, causando condições mais secas que podem afetar a resiliência da floresta a longo prazo. Eventos climáticos extremos, como as secas de 2023 e 2024, intensificam essa situação.

Fonte por: CNN Brasil

Autor(a):

Apaixonada por cinema, música e literatura, Júlia Mendes é formada em Jornalismo pela Universidade Federal de São Paulo. Com uma década de experiência, ela já entrevistou artistas de renome e cobriu grandes festivais internacionais. Quando não está escrevendo, Júlia é vista em mostras de cinema ou explorando novas bandas independentes.