Para Marco Aurélio Mello, não existia “espaço” na decisão sobre Bolsonaro referente a atos de guerra.
Marco Aurélio Mello, ex-ministro do STF, declarou no sábado (19.jul.2025) ao Poder360 que Alexandre de Moraes “potencializou” o artigo 359-I do Código Penal ao determinar medidas cautelares contra Jair Bolsonaro (PL), incluindo o uso de tornozeleira eletrônica. Moraes utilizou o dispositivo para justificar a decisão, proferida na sexta-feira (18.jul) com base em pedido da PGR (Procuradoria Geral da República), que também mencionou um “risco concreto de fuga” do ex-presidente.
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Mello, que se aposentou do STF em julho de 2021 após 31 anos no cargo, afirmou que o dispositivo legal é “excepcional” e não há “espaço” para que seja utilizado nas articulações de Bolsonaro com seu filho Eduardo Bolsonaro (PL-SP), deputado licenciado que reside nos Estados Unidos e defende sanções contra o Brasil. “Acreditar que a atuação de Eduardo Bolsonaro e a do próprio ex-presidente implicariam negociar com governo estrangeiro a agressão ao país, a invasão do país é uma brincadeira”. Não é sério.
O artigo 359-I foi inserido no Código Penal em 2021, no governo Bolsonaro. Aborda condutas que buscam provocar atos de guerra contra o Brasil ou facilitar a invasão do território nacional. Moraes alega que Bolsonaro e seu filho praticaram “atos hostis” ao procurar apoio do governo dos Estados Unidos para interferir em decisões do STF.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (Partido Republicano), anunciou em 9 de julho tarifas de 50% sobre produtos brasileiros a partir de 1º de agosto, alegando que a medida se justificava por uma “perseguição” ao Brasil contra Jair Bolsonaro, que está sendo julgado sob acusação de tentar um golpe de Estado após perder as eleições de 2022 para Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Uma reportagem do Poder360, publicada no sábado (19.jul), revelou que uma parcela do setor jurídico já questionava o emprego do artigo 359-I por Moraes, devido à interpretação considerada “elástica” do ministro. Adicionalmente, outros advogados consultados pelo jornal digital manifestaram apoio à medida, afirmando que o conceito de “guerra” não se limita ao uso de armas.
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Leia abaixo trechos da entrevista com o ex-ministro do STF Marco Aurélio Mello.
Poder360 – Como o senhor avalia a decisão cautelar do ministro Alexandre de Moraes que impôs restrições ao ex-presidente Jair Bolsonaro, como o uso de tornozeleira eletrônica? Marco Aurélio Melo – Tudo está errado, começando pela competência. Estamos falando do ex-presidente Lula. Onde foi julgado o ex-presidente Lula quando era ex-presidente? Na 1ª Instância. Por que Bolsonaro está no Supremo se não houve modificação da legislação? O foro de prerrogativa de função busca proteger o cargo, não o cidadão.
Ao ser julgado na 1ª Instância, você tem acesso a um órgão revisor. Ao ser julgado no Supremo, em decisão uníssona, não há. Quando vamos ter um conserto, com “s” [no sentido de restaurar] e com “c” [no sentido de conciliar]? Lamentavelmente não há ninguém lá [no Supremo] para colocar um dedo na ferida. Para bancar em um colegiado como eu cansei de bancar o esquisito. E divergir.
O ministro Alexandre de Moraes aplicou o artigo 359-I do Código Penal na ordem das medidas cautelares contra Bolsonaro. Trata-se de um artigo inserido no Código Penal em 2021 para punir condutas relacionadas a atos de guerra contra o Brasil ou ações que incentivem a invasão do território nacional. Essa aplicação foi adequada? A utilização do artigo potencializa a situação. Acreditava-se que a atuação de Eduardo Bolsonaro [deputado licenciado e filho 03 de Bolsonaro] e a do próprio ex-presidente implicariam negociar com governo estrangeiro a agressão ao país, a invasão do país é uma brincadeira. Não é sério.
Nesta etapa do processo, em que as decisões judiciais são medidas cautelares, é imprescindível ser preciso no enquadramento. A fase de inquisição é, sem dúvida, embrionária. É uma fase preparatória para uma possível ação penal. Há muita água que deve rolar por baixo da ponte. Ele [Alexandre de Moraes] articula com um tipo penal que não tem espaço para ser observado.
Não se pode interpretar uma “guerra comercial” como tal. Não. Este artigo é de uma exceção extraordinária. E a exceção tem que ser levada em conta de forma estrita. Só quando os parâmetros realmente sugerem o acionamento dela. E no caso não se tem. É querer colocar a família Bolsonaro como vítima. Os tempos são estranhos. De tédio nós não morreremos. É um momento de temperança. Trata-se de uma busca pelo equilíbrio nas ações. A sociedade está acompanhando. E a cada passo, essa grande instituição que é o Supremo Tribunal Federal vai sofrendo um desgaste terrível. Isso é ruim para a nacionalidade.
Fonte por: Poder 360
Autor(a):
Marcos Oliveira é um veterano na cobertura política, com mais de 15 anos de atuação em veículos renomados. Formado pela Universidade de Brasília, ele se especializou em análise política e jornalismo investigativo. Marcos é reconhecido por suas reportagens incisivas e comprometidas com a verdade.