O ministro Alexandre de Moraes, do STF, declarou que o ex-presidente Jair Bolsonaro nunca foi impedido de realizar entrevistas ou discursos em eventos públicos ou privados. Contudo, especialistas consideram que a restrição ao uso ou à aparição em redes sociais, incluindo a de pessoas de confiança, dificulta, na prática, que o ex-presidente fale à imprensa sem o risco de ser preso.
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A manifestação de Moraes está em decisão que analisou a possibilidade de prisão preventiva de Bolsonaro. O ministro reconheceu que o ex-presidente descumpriu medidas cautelares impostas pela Corte, mas classificou o episódio como uma “irregularidade isolada”. Por isso, optou por não decretar a prisão.
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A decisão de Moraes ocorreu após a defesa de Bolsonaro se manifestar ao STF na terça-feira (22.jul) sobre o que o ministro considerou ser o descumprimento das restrições determinadas ao ex-presidente. Os advogados também solicitaram informações sobre se Bolsonaro estava impedido de conceder entrevistas.
Em 21 de julho, Moraes reforçou que a proibição de uso de redes sociais se estendia também à divulgação de trechos de entrevistas nas plataformas digitais por terceiros. Isso significa que qualquer conteúdo – em vídeo, áudio ou texto – divulgado por terceiros nas redes sociais poderá ser considerado violação da medida cautelar, mesmo que seja impossível controlar o que qualquer pessoa possa publicar. O ex-presidente poderá, nesse caso, ser responsabilizado e preso.
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Na quinta-feira (24.jul), embora não tenha vetado expressamente que Bolsonaro fale com a imprensa, Moraes afirmou que não serão admitidos “subterfúgios” para burlar a decisão da 1ª Turma do STF, como o uso de discursos públicos ou entrevistas como “material pré-fabricado” para divulgação nas redes sociais. Citou ainda que a replicação desse conteúdo por “milícias digitais” ou apoiadores políticos poderá ser tratada como agravante.
O ministro não esclarece o que seriam, sob a ótica jurídica, as chamadas “milícias digitais”, o que torna a decisão ainda mais complexa de ser interpretada.
O ministro afirma que as ações que resultaram na proibição estão relacionadas a ter incitado o chefe de Estado estrangeiro a adotar medidas para interferir ilegalmente no curso normal do processo judicial, visando gerar pressão social sobre as autoridades brasileiras, com evidente afronta à soberania nacional. É uma referência à carta do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (republicano), enviada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 9 de julho de 2025 (integral, em inglês – PDF – 192 kB).
Moraes, contudo, não detalha quais teriam sido as ações ilegais, reiterando apenas o “modus operandi” já apontado em decisões anteriores e mencionando um caso concreto como evidência de possível descumprimento: a publicação, por meio das redes sociais do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), de um pronunciamento do ex-presidente ocorrido na segunda-feira (21.jul), na Câmara.
Devido à incerteza da decisão de Moraes, o ex-presidente Jair Bolsonaro decidiu não mais se pronunciar com a imprensa. “Não posso fazer nada”, declarou na quarta-feira (21.jul) ao sair da sede do PL. “Infelizmente não posso conversar com vocês, ok?”, repetiu.
Bolsonaro pode teoricamente se manifestar em entrevistas ou eventos, porém não pode usar tais ocasiões como estratégia para preservar sua presença online por meio de intermediários. Se a Justiça constatar uma tentativa articulada de converter suas declarações em material para redes sociais com “intenções criminosas”, as medidas protetivas podem ser convertidas em prisão preventiva.
A censura indireta se manifesta através de mecanismos que limitam a expressão, sem a necessidade de restrições diretas.
A decisão, para especialistas, é confusa, representa um tipo de censura indireta e gera insegurança jurídica.
Ao Poder360, o ex-ministro do Supremo Marco Aurélio Mello considera que a medida gera um cenário de incerteza jurídica e representa um risco à liberdade de expressão.
O ministro Moraes tomou outra decisão, após o que foi dito sobre a ambiguidade da primeira. A velocidade das transmissões nas redes sociais é incontrolável, gerando insegurança. As pessoas ficam sem saber como agir e o que é de fato permitido.
O ex-ministro, reconhecido por sua histórica defesa das liberdades e prerrogativas constitucionais, reiterou sua posição contrária a qualquer tipo de censura. “Eu sempre defendi a liberdade de expressão. Não me passa pela cabeça a censura. É preciso assegurar a liberdade. Se alguém se incomodar, que se manifeste. A censura não se coaduna com a Constituição Federal. Não se pode cercear a liberdade.”
Marco Aurélio também comparou a situação de Bolsonaro com a de Lula, que foi preso em 2018 após condenações em 2ª e 3ª Instâncias. “Eu, por exemplo, não concebo um presidente com tornozeleira eletrônica. O Lula, quando cumpriu pena, foi preso depois do devido processo legal, depois de condenado. O que não é o caso de Bolsonaro”, disse.
O advogado constitucionalista e articulista do Poder360 André Marsiglia afirma que a decisão não impede que Bolsonaro converse com a imprensa, mas torna inviável tal tipo de manifestação. Para ele, o risco de responsabilização por publicações feitas por terceiros produz um efeito inibidor sobre a liberdade de expressão.
A decisão deixa claro que Bolsonaro não está formalmente impedido de conceder entrevistas ou de ser entrevistado. No entanto, na prática, ele afirmou: “O ministro entendeu que o discurso público do ex-presidente, ao ser reproduzido por terceiros, teria alimentado uma milícia digital e contribuído para atentados contra a soberania nacional”.
A avaliação do advogado ressalta que o temor de prisão decorrente de declarações públicas desestimula o exercício do direito fundamental à manifestação, impondo uma forma de censura indireta. “Isto não está necessariamente sob o controle de Bolsonaro. Essa lógica acaba por inibi-lo de se expressar. No direito, chamamos isso de ‘chilling effect’, ou efeito inibidor — quando não há uma proibição direta, mas sim um desestímulo ao exercício da liberdade de expressão”, explicou.
Temendo algo que está fora de seu controle, ele passará, portanto, a recear proferir discursos ou conceder entrevistas.
O advogado Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do grupo Prerrogativas, considerou que a decisão de Moraes, ainda que cause incertezas, oferece informações importantes acerca dos limites aplicados a Bolsonaro.
O ministro busca impedir que Bolsonaro utilize as redes sociais para incitar os apoiadores bolsonaristas que buscam soluções não democráticas para a crise que eles mesmos geraram.
O autor do Prerrogativas também destacou que Moraes não determinou a prisão preventiva do ex-presidente, mesmo com o descumprimento ocasional da medida protetiva.
“Pode parecer estranho ouvir isso de um advogado progressista, reconhecidamente lulista, mas a coerência é um valor do qual nenhum de nós pode abrir mão”, disse. Para o advogado, embora seja verdade que a replicação de conteúdo nas redes possa sair do controle de Bolsonaro, ele ainda deve ser responsabilizado pelas falas que decide tornar públicas. “Ele tem que ter mais responsabilidade sobre o que fala”, concluiu.
Compreenda a situação.
A transmissão da fala de Bolsonaro na Câmara dos Deputados na segunda-feira (21.jul), divulgada por seu filho Eduardo Bolsonaro (PL-RJ) e aliados nas redes sociais, foi apontada como exemplo de descumprimento. Segundo Moraes, o conteúdo visava “induzir e instigar chefe de Estado estrangeiro a interferir ilicitamente” em investigações conduzidas no Brasil. Esse tipo de conduta, segundo o ministro, justificou a imposição das medidas cautelares.
Bolsonaro apresentou a pulseira eletrônica a jornalistas pela primeira vez e considerou a medida como “vergonha”.
Veja (46s):
Moraes também rejeitou o argumento da defesa de que a circulação das falas nas redes seria um desdobramento natural e incontrolável da comunicação digital. Para o ministro, há um uso doloso das plataformas por apoiadores previamente organizados com o objetivo de manter a prática de condutas ilícitas.
Medidas restritivas.
A partir de 18 de julho, após uma operação da Polícia Federal, Bolsonaro está sujeito a uma série de restrições.
As medidas foram confirmadas pela 1ª Turma do STF por 4 votos (Moraes, Carmen Lúcia, Flávio Dino e Cristiano Zanin) a 1. O ministro Luiz Fux foi o último a votar e discordou dos demais em relação ao emprego da tornozeleira eletrônica e de certas restrições.
Fux afirma que a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República “não apresentaram provas novas e concretas nos autos de qualquer tentativa de fuga realizada ou planejada pelo ex-presidente”.
Fonte por: Poder 360