Magnata do cacau e multinacional italianas envolvidas em disputa com indígenas na Bahia

Magnata do cacau e multinacional italiana figuram em registros de terras e lideram associações de “preservação”, gerando suspeitas no processo de demarcação.

30/09/2025 6:02

4 min de leitura

(Imagem de reprodução da internet).

Conflito Fundiário e Resistência Indígena na Terra Indígena Comexatibá

A região onde se encontra a Terra Indígena Comexatibá, localizada no extremo sul da Bahia, enfrenta um longo e complexo conflito fundiário. Há dez anos, o processo de demarcação da TI, que reconhece a área como originária do povo Pataxó, está paralisado. Essa situação jurídica permitiu que fazendeiros e empresários consolidassem ocupações, registraram propriedades sobrepostas e impulsionaram a especulação imobiliária, visando a área, cobiçada por pousadas de luxo e condomínios fechados.

O povo Pataxó denuncia não apenas a grilagem e tentativas de privatização das praias, mas também uma escalada de violência, marcada por bloqueios armados e o assassinato de jovens indígenas. A FUNAI delimitou o território em 2015, reconhecendo o relatório circunstanciado que apontava a área como originária dos Pataxó. Contudo, 151 contestações apresentadas por fazendeiros e associações ligadas a empresários têm atrasado a homologação. Em resposta, os indígenas têm realizado “retomadas” como forma de resistência, ocupando fazendas como Imbassuaba e Portal da Magia, listadas entre as 78 propriedades consideradas irregulares.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

Entre os principais atores envolvidos estão empresários como Ernesto Ary Neugebauer, dono da Danke e sócio da Gencau, e Igor Guerra Ulhôa, sócio da Construtora Horto Ltda. Neugebauer é apontado como proprietário de Imbassuaba e Horto do Sol, enquanto Ulhôa está ligado ao bloqueio da praia com seguranças armados. Ambos têm se envolvido em atividades que visam o loteamento de imóveis e a incorporação de empreendimentos imobiliários, conforme registrado no Sistema Nacional de Cadastro Rural.

Leia também:

Outros personagens centrais incluem a multinacional italiana Maccaferri, representada na região através da Portal da Magia Empreendimentos e da APPD, e a família Lessa, envolvida em antigas denúncias de comercialização ilegal de terras do INCRA. A APPD, fundada em parceria com Neugebauer e o italiano Stefano Orsi, é vista pelos indígenas como uma fachada para contestar a demarcação e tentar assumir a gestão do Parque Nacional do Descobrimento, atualmente sob gestão do ICMBio.

A Resistência e a Falta de Ação Estatal

A complexidade do conflito se agrava com a atuação de grupos empresariais que, segundo indigenistas como Juliano Fonseca, tiveram um papel decisivo na criação do parque, instalado em 1999 em parte da terra indígena. Eles, ao invés de defender os interesses do povo Pataxó, criaram novas áreas para atrair turismo e estradas, numa estratégia de descaracterizar as terras indígenas. A resistência dos indígenas se manifesta não apenas através das retomadas, mas também na denúncia da falta de ação estatal.

Apesar do reconhecimento do INCRA do assentamento PA Cumuruxatiba e da existência de vendas ilegais de lotes, o Estado tem sido insuficiente na resolução dos conflitos, atribuindo a responsabilidade à Justiça. A FUNAI, por sua vez, informa que já analisou todas as contestações ao relatório de delimitação, mas o processo está na Procuradoria aguardando parecer jurídico para ser encaminhado ao Ministério da Justiça.

Violência e a Urgência da Demarcação

A situação se agrava com a violência sofrida pelo povo Pataxó. Entre 4 e 8 de agosto, indígenas relataram disparos de armas de fogo contra aldeias e contra a retomada de Imbassuaba. Nos últimos anos, três jovens Pataxó – Gustavo, Nawir e Samuel – foram assassinados em conflitos com fazendeiros. A presença de efetivos da Polícia Integrada na região, desde abril, visa conter os confrontos, mas a situação permanece crítica. A urgência da demarcação da Terra Indígena Comexatibá se torna ainda mais evidente diante da violência e da ameaça à sobrevivência do povo Pataxó.

Autor(a):

Com uma carreira que começou como stylist, Sofia Martins traz uma perspectiva única para a cobertura de moda. Seus textos combinam análise de tendências, dicas práticas e reflexões sobre a relação entre estilo e sociedade contemporânea.