A Justiça paulista absolveu, na sexta-feira 25, a multiartista e escritora Preta Ferreira, sua mãe Carmen Silva, liderança do Movimento Sem-Teto do Centro (MSTC), e outras lideranças da luta por moradia em São Paulo, da acusação de extorsão de moradores da ocupação do Hotel Cambridge, no centro da capital.
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A sentença foi determinada pela 1ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Capital. O juiz Paulo Fernando Deroma de Mello reconhece a inexistência de qualquer prova material e ressalta que a denúncia se baseava em depoimentos “genéricos e frágeis”.
Em março deste ano, o Ministério Público de São Paulo (MPSP), responsável pela acusação, já havia reconhecido a ausência de provas e solicitado a absolvição de todos os líderes, incluindo Preta, Carmen e outros 17 integrantes de movimentos sem-teto da capital paulista. A solicitação foi aceita pela 1ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Capital.
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O processo iniciou em 2019, resultando em prisões preventivas prolongadas e ampla exposição pública das lideranças. Preta Ferreira chegou a ficar 108 dias presa. Na época, a denúncia foi tratada como mais um episódio de criminalização das organizações populares que atuam pelo direito à moradia na cidade.
Preta Ferreira declarou que a absolvição valida o que as lideranças sempre defenderam. “Não houve crime — houve racismo. Nunca houve prova — houve perseguição e tentativa de criminalizar a luta por moradia digna”, afirmou.
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Ela afirmou ao jornal Voz da Diversidade: “Ser capaz de dizer ‘pretas livres’, com a liberdade reconhecida, nos dá mais força para clamarmos pelas que ainda não estão.”
Carmen Silva garante que a luta continua.
Carmen Silva também foi absolvida, afirmando à Voz da Diversidade que a sentença marca o encerramento de um ciclo de sofrimento. “Eu sempre tive coragem de lutar por meus direitos na cidade, mas nunca vou perdoar quem envolveu minha família em uma história que era motivada por justiça”, declarou.
Em declarações públicas, ela e outros líderes expressaram gratidão pelo apoio de familiares, movimentos populares, advogados e artistas que permaneceram solidários. “Manteremos a luta. Porque não há sentença mais poderosa do que a verdade sustentada pela coletividade”, afirma o texto.
Prisão sem provas e tentativa de desmobilização
Em 2019, Preta Ferreira informou ao Brasil de Fato que sua detenção tinha motivação política. Ela afirmou ter sido abordada após comparecer voluntariamente à delegacia, relatando ter sido pega de surpresa ao prestar depoimento em flagrante delito sem evidências. A acusação se fundamentava em uma carta anônima e relacionava o MSTC a supostas extorsões em ocupações, incluindo um imóvel do qual a organização não tinha ligação.
“Eu fui presa por combater a injustiça. Isso sempre esteve em minhas veias”, declarou Ângela Ângelo. “Já sabemos muito bem que não estou presa por extorsão. Não pratiquei nenhum crime. Isso é mentira e eles sabem disso”.
A promotora declarou que os ocupantes das áreas do MSTC efetivavam, de maneira estruturada, o pagamento de R$ 200 mensais para a conservação dos edifícios. “Como se apropria-se de alguém que já sabe que deve pagar para acessar um local?” , argumentou.
Ela também denunciou o uso de sua imagem como instrumento de intimidação aos movimentos: “Essa perseguição toda ao movimento de moradia faz parte de um plano para acabar com os movimentos. Prendem as lideranças, amedrontam quem não tem moradia, e aí acaba”.
A prisão preventiva de Preta estendeu-se por 108 dias. Em sua permanência na Penitenciária Feminina de Santana, ela comunicou ao Brasil de Fato o contato com outras mulheres negras encarceradas indevidamente. “Nos jogaram em um navio negreiro”, afirmou. A vivência transformou-se em livro em 2020: Minha Carne – Diário de uma prisão.
Fonte por: Carta Capital