Investigadores da Polícia Civil do Rio Grande do Sul estão envolvidos em estudo pioneiro acerca de assédio e sofrimento psíquico no ambiente de trabalho

A iniciativa da Ugeirm visa identificar ocorrências de assédio e sugerir ações para aprimorar o ambiente laboral da empresa.

17/07/2025 17:19

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Investigadores da Polícia Civil do Rio Grande do Sul estão envolvidos em estudo pioneiro acerca de assédio e sofrimento psíquico no ambiente de trabalho
(Imagem de reprodução da internet).

Uma pesquisa inédita direcionada aos policiais civis do Rio Grande do Sul foi lançada nesta semana pelo sindicato que representa escrivães, inspetores e investigadores da corporação (Ugeirm). A iniciativa visa identificar casos de assédio moral, sexual e atitudes discriminatórias que ocorreram no âmbito da Polícia Civil entre os anos de 2015 e 2025. A coleta de dados será realizada entre os dias 15 de julho e 18 de agosto, por meio de um formulário anônimo e confidencial.

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A proposta emerge em razão de uma crescente preocupação com o sofrimento mental de profissionais da Segurança Pública e da persistência de práticas abusivas, que, segundo o sindicato, permanecem disfarçadas devido ao receio de retaliações e à estrutura hierárquica inflexível da instituição.

A diretora da Ugeirm, Neiva Carla Back, destaca que a pesquisa visa romper o silêncio histórico sobre o tema. “O assédio é uma realidade conhecida dentro da Polícia Civil. Mas, por medo e falta de proteção, muitos servidores se calam. A pesquisa é uma forma de escutar quem está na ponta, quem sofre no dia a dia, e começar a construir caminhos concretos para enfrentar esse problema”, afirma.

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A pesquisa se destina a todos os níveis hierárquicos da corporação – comissários(as), delegados(as), escrivães(ãs), inspetores(as) e investigadores(as) – incluindo policiais aposentados. O questionário aborda o perfil das vítimas, a frequência e o tipo de assédio, além da relação hierárquica entre os envolvidos. Há também espaço para relatos espontâneos, que auxiliarão na compreensão do impacto desses episódios na saúde física e mental dos servidores.

Doença e a cultura do silêncio.

Pesquisas nacionais já apontam que o ambiente da Segurança Pública é um dos mais vulneráveis ao sofrimento mental de seus profissionais. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o número de policiais civis e militares que cometeram suicídio em 2023 ultrapassou as mortes registradas em situações de confronto direto. Casos como o da escrivã Rafaela Drumond, que tirou a própria vida após ser vítima de assédio por um colega, evidenciam a seriedade do problema e a importância de ações institucionais para o apoio e a proteção dos servidores.

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A estrutura de atuação da Polícia Civil agrava tais situações. A polícia, juntamente com o Judiciário, é uma das instituições mais hierarquizadas do país. E, por conseguinte, autoritária. Essa cultura verticalizada possibilita práticas abusivas que se naturalizam e que silencia as vítimas.

A gestora ressalta que o próprio estatuto da Polícia Civil (Lei 7.366), que regulamenta as relações funcionais na instituição, é datado de antes da Constituição de 1988. “Isso implica que as relações de trabalho dentro da polícia ainda seguem uma lógica antecedente ao processo de redemocratização do país. É necessário repensar essa estrutura, atualizar as normas internas e democratizar o funcionamento da instituição para assegurar um ambiente de trabalho saudável”, argumenta.

Subnotificação e confiança

Um dos obstáculos da pesquisa será contornar o problema da subnotificação. De acordo com a Ugeirm, diversos policiais evitam registrar denúncias formais por temor de retaliações, isolamento nas equipes ou transferência forçada.

Atualmente, na maioria dos casos, quando há uma denúncia de assédio, a solução adotada é transferir a vítima. O agressor permanece no mesmo local, sem quaisquer consequências. Isso reforça o medo e o silêncio, e precisa mudar urgentemente, afirma Back.

Para assegurar a segurança dos envolvidos, a responsável enfatiza que não haverá intervenção da administração da Polícia Civil no processo. “O primeiro passo é deixar evidente que esta pesquisa é uma iniciativa do sindicato, totalmente independente da chefia da instituição. O segundo é garantir que os dados serão mantidos em sigilo absoluto. Nenhuma informação pessoal será coletada ou divulgada”, assegura.

Propostas e próximos passos

Com base nos dados coletados, a Ugeirm visa elaborar um conjunto de propostas para lidar com o problema de maneira organizada. A sindicalista declara que a criação de protocolos específicos de atendimento às vítimas será uma prioridade.

É necessário um regulamento institucional que assegure a proteção aos(às) servidores(as) que relatam assédio. Isso abrange desde o oferecimento de apoio psicológico até medidas funcionais para que a vítima não sofra prejuízos. Além disso, propõe-se a criação de uma ouvidoria especializada na Polícia Civil para receber e tratar desses casos com a devida atenção.

A gestora destaca que o levantamento representa apenas o início de um processo mais amplo de escuta e transformação institucional. “Confrontar o assédio é uma questão de saúde, dignidade e sobrevivência. A pesquisa é o primeiro passo de uma estratégia mais longa, que inclui escuta, acolhimento e construção coletiva de propostas. O objetivo final é assegurar ambientes de trabalho mais seguros, humanos e respeitosos para todos os profissionais da Segurança Pública”, afirma.

Casos recentes e o contexto institucional

A preocupação com o tema se insere também em um contexto mais amplo de denúncias dentro da própria estrutura da Polícia Civil. Em 2021, o então chefe da corporação no estado foi investigado por condutas consideradas abusivas, o que expôs os limites da organização para lidar com esse tipo de situação. Apesar do caso ter tido repercussão pública, nenhuma alteração estrutural relevante foi realizada até o presente momento.

Para Back, a transformação deve começar pela escuta. “Só vamos conseguir mudar essa realidade se começarmos ouvindo quem está dentro dela. Essa pesquisa é uma oportunidade de dar voz a essas pessoas, que muitas vezes estão sofrendo em silêncio”, conclui.

Fonte por: Brasil de Fato

Autor(a):

Lucas Almeida é o alívio cômico do jornal, transformando o cotidiano em crônicas hilárias e cheias de ironia. Com uma vasta experiência em stand-up comedy e redação humorística, ele garante boas risadas em meio às notícias.