Em Canal Street, há barracas informais que vendem réplicas de bolsas Louis Vuitton, relógios Rolex e produtos da Apple, a preços significativamente infe…
No início da semana, o governo do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, acusou o Brasil de promover o comércio ilegal e produtos falsificados, considerando o país como um exemplo negativo para a economia global. O texto afirma que o governo norte-americano iniciou uma investigação sobre “práticas comerciais desleais” no Brasil e que “a região da Rua 25 de Março permanece há décadas como um dos maiores mercados para produtos falsificados, apesar das operações de fiscalização direcionadas a essa área”.
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É possível observar, ao caminhar por Manhattan, em Nova York, uma realidade que o governo Trump prefere ignorar. O Canal Street, em Chinatown, é um dos maiores polos de comércio informal dos Estados Unidos. As imagens, capturadas na quinta-feira, 17, ilustram o que novos-iorquinos e turistas já contemplam frequentemente: barracas temporárias e vendedores ambulantes oferecendo bolsas Louis Vuitton, carteiras Gucci, mochilas Prada, relógios Rolex, óculos de sol Ray-Ban e produtos da Apple – tudo falsificado e vendido a um preço muito inferior ao original, negociado abertamente nas ruas.
Apesar de ações isoladas da polícia de Nova York para combater o comércio ilegal e a pirataria serem consideradas crime federal, o que se observa na prática é uma forma de “ institucionalização da ilegalidade”, onde as autoridades ignoram a situação e os vendedores encontram formas criativas de evitar a fiscalização. Na maioria dos casos, o comércio informal serve de sustento para imigrantes, principalmente chineses, bengaleses, haitianos e latino-americanos, que têm dificuldades para acessar o mercado formal.
De acordo com um relatório da U.S. Customs and Border Protection, entre outubro de 2023 e setembro de 2024, foram apreendidos mais de 20 mil produtos relacionados à violação de direitos de propriedade intelectual, com um valor estimado de 5,5 bilhões de dólares (valores ao varejo caso os produtos fossem originais). Mais de 75% tinham como destino Nova York e Los Angeles. Isso sem considerar gigantes da tecnologia e sites norte-americanos, como a Amazon, eBay e Etsy, que já foram alvo de denúncias por permitirem a venda de produtos falsificados, desde peças de automóveis até medicamentos.
A trajetória do 25 de Março apresenta paralelos com a da Canal Street. Ambas surgiram do espírito empreendedor de imigrantes — árabes, judeus e portugueses em São Paulo; chineses e bengaleses em Nova York — que identificaram no comércio informal uma oportunidade econômica. A distinção reside no nível de institucionalização.
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Em São Paulo, o progresso das associações de comerciantes, a emissão de notas fiscais e a cobrança consistente de impostos formaram um cenário misto: estabelecimentos formais próximos a operações não regulares, todos sob monitoramento contínuo da Receita Federal e da Polícia Civil. O prefeito Ricardo Nunes (MDB) justificou a área após o anúncio dos Estados Unidos:
O comércio na Rua 25 de Março não pode ser considerado ilegal. Caso haja venda de produtos falsificados, caberá à Receita Federal e aos órgãos de combate à pirataria fiscalizar.
A Associação Representativa do Comércio da Região da 25 de Março afirma que mais de 3 mil empresas formais importam mercadorias, principalmente dos Estados Unidos, sem ligação com os EUA. Incidentes de pirataria, segundo a entidade, são casos isolados e estão sob constante vigilância.
No final, a Marinha e a Canal Street evidenciam duas faces da mesma engrenagem: desigualdade, globalização e economia de resistência. Ao criticar Brasília, o governo Trump expõe não apenas um conflito comercial, mas a lógica assimétrica que permite à Nova York ignorar, sob seus próprios arranha-céus, o que denuncia em território estrangeiro.
Fonte por: Carta Capital
Autor(a):
Apaixonada por cinema, música e literatura, Júlia Mendes é formada em Jornalismo pela Universidade Federal de São Paulo. Com uma década de experiência, ela já entrevistou artistas de renome e cobriu grandes festivais internacionais. Quando não está escrevendo, Júlia é vista em mostras de cinema ou explorando novas bandas independentes.