Bloco BRICS analisa a possibilidade de estabelecer uma “moeda comum” entre seus membros
Especialistas desconsideram que proposta em oposição ao dólar seja adotada; em contrapartida, defendem que o bloco deve concentrar-se em promover o uso …

O debate acerca da criação de uma moeda comum para transações comerciais entre os países do BRICS tem oscilado nos últimos anos. A alternativa poderia desafiar a hegemonia do dólar americano na economia global e impulsionar potências emergentes como a China. No entanto, na avaliação de especialistas e integrantes do governo brasileiro, a medida não deve se concretizar.
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) argumentou que os países do bloco (Brasil, Arábia Saudita, África do Sul, China, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Índia, Indonésia, Irã e Rússia) pudessem empregar uma moeda alternativa ao dólar em suas operações comerciais.
Em 2024, o chefe do Executivo reiterou que a construção de uma alternativa ao dólar para o comércio entre os países do bloco deve avançar e não pode mais ser adiada, e defendeu meios de pagamento alternativos.
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Apesar das declarações do presidente, o embaixador Maurício Lyrio, encarregado de representar o Brasil no BRICS, negou em uma coletiva de imprensa em fevereiro deste ano os boatos sobre a criação de uma nova moeda.
A proposta também foi descartada por líderes mundiais, incluindo o presidente da Rússia, Vladimir Putin. Em outubro do ano passado, o líder russo classificou o assunto como algo “prematuro”.
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Putin propôs a criação de um sistema de pagamento entre as nações do BRICS, visando contornar as sanções econômicas aplicadas após a invasão da Ucrânia em 2022.
Alternativas à “moeda comum”.
Apesar do tema ter se ampliado, um acordo entre especialistas nas áreas econômica e política é que ele não foi oficialmente abordado.
O professor de direito internacional e coordenador do grupo de pesquisa Brasil-China da FGV, Evandro de Carvalho, explica que sobre a mesa de negociações está o aprimoramento do uso de moedas locais no comércio intra-BRICS e a proposta de desenvolver um novo sistema de pagamento com o objetivo de diminuir a dependência do sistema SWIFT, o que resultaria na redução da dependência do dólar americano.
Carvalho também está no corpo docente da UFF, em Pequim, onde realizou seu pós-doutorado na Universidade de Finanças e Economia de Xangai. Ele argumenta que a China possui trocas comerciais intensas com cada um dos países do grupo, porém essas nações não têm a mesma troca entre si.
Os países do BRICS estão, ativamente, explorando o aumento do comércio em moedas locais para estimular o comércio entre eles e têm alcançado avanços nessa área.
O pesquisador do Instituto Sul-Africano de Assuntos Internacionais Gustavo Carvalho também aponta que não há nenhuma discussão séria sobre a criação de uma moeda comum entre os países do BRICS, e, segundo ele, por razões econômicas sólidas.
Uma das questões reside no fato de que os países que compõem o bloco apresentam realidades financeiras bastante diversas. Isso inclui a potência da China, com inflação controlada em torno de 2% ao ano, e economias mais instáveis, como a do Brasil.
O comércio entre os países BRICS representa apenas 18% do total das suas trocas comerciais, muito abaixo dos 64% que existiam na União Europeia antes do euro, demonstrando a falta de integração econômica necessária para uma moeda única, afirmou Carvalho à CNN.
Apesar de não concordar com o emprego de um título consensual entre os integrantes do bloco econômico, o professor de Relações Internacionais da PUC-SP Laerte Apolinário declara que existe um debate mais amplo acerca da “desdollarização”, processo de substituição do dólar americano.
A criação de uma moeda comum, ainda que digital ou representativa, poderia fortalecer a importância do yuan e aumentar a influência da China. Por isso, há resistência por parte de outros membros, notadamente da Índia, que teme que o BRICS se torne um instrumento da diplomacia chinesa.
Em maio deste ano, o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin (PSB), negou que os ministros do Comércio dos países do BRICS tivessem debatido medidas para enfraquecer o uso do dólar no comércio internacional, incluindo o emprego de moedas locais nas transações entre os membros do bloco.
O professor acrescenta que o consenso é bastante restrito. Em geral, os países têm buscado priorizar o fortalecimento do uso de moedas nacionais e o desenvolvimento de infraestruturas regionais de pagamento, como alternativas mais viáveis e práticas.
A flutuação das taxas de câmbio e o sistema de pagamentos BRICS Pay.
Outra medida que pode substituir de forma mais ampla a discussão sobre a criação de uma moeda comum é o swap cambial, continua Apolinário. Adotado em maio deste ano pelos bancos centrais do Brasil e da China, o acordo permite que transações comerciais sejam realizadas sem passar pelo dólar, reduzindo a exposição do câmbio.
O BRICS Pay é uma plataforma digital de pagamentos em moeda local para os países associados ao grupo, buscando ser uma alternativa financeira descentralizada.
A CNN, o especialista Gustavo Carvalho também explica que, na realidade, o que existe são estratégias complementares concentradas nos seguintes pontos:
O banco BRICS, liderado pela ex-presidente Dilma Rousseff, já destina aproximadamente 30% de seus empréstimos a moedas alternativas ao dólar. As estratégias são complementares e atuam como instrumentos para diversificar gradualmente as opções financeiras.
Luiza Perruffo, professora do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS, afirma que a discussão sobre a moeda comum teve início em 2023, durante a cúpula de Johannesburgo.
“Acredito que não é provável no curto prazo observar o surgimento de uma nova moeda”, afirma Perruffo. “Principalmente para o comércio, e que siga mais pelo lado da expansão do uso das moedas locais, onde a moeda chinesa deve, sem dúvida alguma, se destacar”, conclui.
O Brasil tem como prioridade financeira o fortalecimento do BRICS, buscando maior influência e participação nas decisões globais de economia.
A presidência brasileira do BRICS indica “medidas de facilitação de comércio” entre os membros, incluindo cooperação regulatória, e o cumprimento de acordos firmados na cúpula de Johannesburgo, ocorrida há dois anos.
Para atender ao mandato definido pelos líderes do BRICS em Johannesburgo, em 2023, o Brasil prosseguirá com os esforços de cooperação para desenvolver meios de pagamento locais que promovam o comércio e o investimento, utilizando sistemas de pagamento mais acessíveis, transparentes, seguros e inclusivos entre os países membros do BRICS.
O Brasil percebe que o comércio e o investimento entre os países do BRICS ainda são modestos quando comparados aos fluxos entre nações desenvolvidas.
A administração brasileira à frente do grupo não detalhou, mas destacou que a reunião anual deverá apresentar estratégias econômicas para 2030 com foco em investimentos, economia digital e investimento sustentável.
A cúpula do BRICS será realizada nos dias 6 e 7 de julho, na cidade do Rio de Janeiro.
O Brasil detém a maior fatia de vendas de veículos elétricos na América Latina.
Fonte por: CNN Brasil
Autor(a):
Gabriel Furtado
Gabriel é economista e jornalista, trazendo análises claras sobre mercados financeiros, empreendedorismo e políticas econômicas. Sua habilidade de prever tendências e explicar dados complexos o torna referência para quem busca entender o mundo dos negócios.