Convido todas as pretas a participarem de alguma das atividades que estão sendo realizadas neste Julho das Pretas.
Aos 25 de julho é celebrado o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, também o Dia Nacional Tereza de Benguela, data que diversas mulheres, que inclusive eu incluía nessa estatística há quase uma década, sequer sabíamos da existência ou do significado.
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Reflito bastante sobre o que significa ser militante e sobre a experiência de pertencer a uma militância. Quem é considerado militante? Quem não é? Quem possui a “carteirinha”? Quem teve a “carteirinha” cancelada? Quem realiza a “cassação” da carteirinha? Quem decide o que define a militância? Gosto de revisitar minha trajetória. Quem era Miss Preta, “na fila da militância” antes de ir para o Paraná?
Antes de ser Miss Pinhais, a decisão de participar do concurso se deu justamente pela percepção da ausência de mulheres negras nesses ambientes, e nunca antes havia tido contato com espaços de militância negra, especialmente os organizados. Acredito que meu primeiro contato com a militância organizada foi através da Marcha do Orgulho Crespo, e ainda foi sob o aspecto do meu “nicho”, “Princesa da Marcha do Orgulho Crespo”. Nunca me aproximei do MNU, AMNB, Rede de Mulheres Negras ou qualquer movimento organizado de negritude.
Ainda assim, a Miss Preta nunca foi ativista do movimento negro antes de tudo isso, veja-se… se impor a ela? Contudo, para comprovar tal afirmação seria imprescindível desconsiderar toda a minha vivência como mulher negra.
Mãe, mulher negra, cabocla, me ensinou, na prática, um pouco do que é feminismo sem sequer saber definir o que era feminismo e antes mesmo de eu ter a oportunidade de acesso a qualquer literatura. Mãe me ensinou a ser forte num mundo em que pessoas como nós já nasceram com condições adversas. Mãe me ensinou a ter a cabeça sempre erguida e lutar pelo que eu acreditava… só não poderia envergonhá-la (ela sempre, de maneira muito séria, me alertava sobre).
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A infância no acampamento do MST na minha cidade, Campos do Goytacazes-RJ, além de me apresentar à coletividade, me proporcionou algum conhecimento sobre o conceito de militância.
Por fim, quantas mulheres negras no Brasil sequer conhecem as organizações? Seria que sequer têm acesso a esses espaços? Como trazê-las para a luta? Não se trata de procurar a identificação de militante entre aquelas que se unem e ocupam espaços de poder. Também não se busca quantificar o nível de engajamento de cada mulher que luta por algo. Frequentemente o ponto comum desse “algo” é a própria existência de todas nós.
Não há uma maneira única de atuar como militante, não existe um jeito único de se relacionar com a atividade militante. Não existe um manual de instruções de “como trilhar o caminho da militância” ou de “como ser um militante padrão”. Nós já não somos o “padrão” das coisas, não precisamos nós mesmas nos colocarmos nessa moldura. Acredito que a luta de todas nós é a luta antirracista e de valorização da negritude.
Diante das anomalias que comprometem a nossa democracia, que ainda não é totalmente realizada para o povo negro (por isso persistimos em avançar, mas com cautela para evitar retrocessos em tempos desafiadores), mais do que nunca, mulheres de todo o Brasil precisam estar unidas.
Convido todas as pretas, ou seja, cada preta, latina, caribenha e cada brasileira, que se sente silenciada e com muito a dizer, a participar de alguma das mais de 643 atividades que estão sendo realizadas neste Julho das Pretas em todo o Brasil.
Nós pretas estamos acostumadas a ter que colocar o pé na porta para alcançar algo. Vamos deixar essa porta aberta para quem quer chegar? Meter o pé na porta coletivamente, certamente é muito melhor e mais prazeroso e eu, Miss Preta, lembrando sempre das que vieram antes, estarei aqui, conduzindo pretinhas pela mão por esta porta que a gente vem abrindo, cada uma do seu jeito, com o mesmo propósito coletivo e caminhando para o mesmo lugar, que talvez não seja para nós, mas para as que virão.
Edna Sousa, popularmente conhecida como Miss Preta, representou a maior votação entre os vereadores na história de Pinhais (PR). Ativista e Comunicadora Popular, graduada em Processos Gerenciais, emprega sua voz e plataformas digitais para impulsionar a luta de mulheres, jovens, da população negra e da comunidade LGBTQIAPN+.
Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente reflete a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Fonte por: Brasil de Fato
Autor(a):
Com formação em Jornalismo e especialização em Saúde Pública, Lara Campos é a voz por trás de matérias que descomplicam temas médicos e promovem o bem-estar. Ela colabora com especialistas para garantir informações confiáveis e práticas para os leitores.