A busca pelo centro do Universo revela questionamentos antigos e novos estudos sobre a expansão cósmica e a radiação de fundo. Existe um centro físico real?
Desde a Antiguidade, a humanidade se depara com uma pergunta intrigante: qual é a nossa posição no Universo? Durante séculos, acreditou-se que a Terra ocupava um lugar central. Com o tempo, essa centralidade foi atribuída ao Sol e, posteriormente, à Via Láctea.
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Cada avanço científico revelou que nossa posição é menos privilegiada do que se pensava.
Ainda assim, a dúvida persiste em uma escala maior: existe um centro no próprio Universo? Na cosmologia moderna, essa questão é tanto filosófica quanto científica. Um estudo recente aborda esse debate, analisando a expansão do Universo e a radiação cósmica de fundo para investigar a possível existência de um centro físico real.
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O estudo parte do modelo cosmológico baseado nas equações de Friedmann, que descrevem um Universo em expansão. Nesse modelo, a expansão não se origina de um ponto específico, mas do espaço como um todo. Assim, qualquer observador perceberá todas as galáxias se afastando, independentemente de sua localização.
A lei de Hubble, que relaciona a velocidade de afastamento das galáxias à distância, reforça essa ideia. Matemáticamente, todos os pontos parecem equivalentes, o que impede a conclusão sobre a existência de um centro real no Universo apenas com base na expansão observada.
Para abordar essa ambiguidade, o artigo propõe duas interpretações distintas dentro do Universo de Friedmann. No modelo sem centro, o espaço é comparado à superfície de um balão em expansão, onde o centro não faz parte do Universo e não possui significado físico observável.
Todos os observadores são equivalentes.
No modelo com centro, a expansão teria origem em um ponto físico real. Cada região do espaço se afastaria desse centro a uma velocidade proporcional à distância. Embora a expansão faça parecer que qualquer ponto é central, apenas o verdadeiro centro não se moveria em relação ao restante do Universo.
Para diferenciar entre esses cenários, o estudo utiliza a radiação cósmica de fundo (CMB), um dos pilares da cosmologia observacional. Essa radiação, remanescente do Universo primordial, preenche todo o espaço e é observada como um fundo quase uniforme de micro-ondas.
Observações precisas da CMB revelam uma anisotropia chamada dipolo, caracterizada por uma leve diferença de temperatura entre direções opostas do céu. Esse dipolo sugere que o observador está em movimento em relação ao referencial da radiação cósmica de fundo.
O artigo apresenta teoremas que interpretam o significado do dipolo. Em um Universo sem centro, a simetria do espaço impediria a existência de um dipolo em qualquer ponto. Mesmo movimentos locais não gerariam essa anisotropia. Por outro lado, em um Universo com centro, o dipolo surgiria naturalmente.
Todo observador afastado do centro detectaria uma anisotropia proporcional à sua velocidade de afastamento. Apenas no centro o dipolo seria inexistente, tornando a observação desse efeito um indício favorável à existência de um centro cósmico.
A partir dessa interpretação, o autor utiliza dados observacionais para tentar localizar o possível centro do Universo. A análise considera a velocidade do dipolo da CMB, o movimento peculiar do Sistema Solar, o deslocamento do aglomerado de Virgem e a influência do Grande Atrator.
Os cálculos indicam uma região a dezenas de megaparsecs de distância, próxima à galáxia Centaurus A. O artigo ressalta que essa estimativa está sujeita a incertezas e depende de hipóteses sobre os movimentos cósmicos.
O estudo também introduz a ideia de um centro aparente, que pode surgir mesmo em um Universo sem centro real. Isso ocorre porque o Universo tem uma idade finita e apenas uma fração dele pode influenciar observacionalmente um ponto específico.
Nesse contexto, uma região limitada do cosmos pode se comportar como um universo completo, criando a ilusão de um centro local. Diferentes observadores em locais distintos identificariam centros diferentes, diferenciando esse cenário de um Universo com um centro único.
Por fim, o estudo não oferece uma resposta definitiva sobre a existência de um centro no Universo, mas expõe os limites da observação científica atual. Todas as medições disponíveis partem da Terra, o que dificulta a distinção entre um centro físico real e um efeito aparente da nossa posição no cosmos.
Autor(a):
Fluente em quatro idiomas e com experiência em coberturas internacionais, Ricardo Tavares explora o impacto global dos principais acontecimentos. Ele já reportou diretamente de zonas de conflito e acompanha as relações diplomáticas de perto.